O Castelo de São João Batista é um fortificação abaluartada, um tipo de arquitetura militar desenvolvido a partir do final do século XV para enfrentar o avanço de artilharia móvel no terreno. Esse sistema incluía a chamada esplanada, um plano inclinado exterior ao fosso que obrigava qualquer arma de fogo do inimigo, que pretendesse atingir a fortificação com um tiro direto, a ficar completamente exposta aos defensores. O Relvão é, por conseguinte, um importante elemento do Castelo de São João Baptista, uma parte da sua esplanada de defesa. Terá origem numa fase mais adiantada da construção desta fortaleza, pelos inícios de 1600.
Com a construção das muralhas que delimitam a esplanada e que criaram acessos ao Portinho Novo, foi possível nivelar um pouco este terreno cuja orografia natural era bastante inclinada. Mais tarde, com alguns aterros e mobilizações efetuadas para uso recreativo, esse espaço ganhou os contornos que hoje vemos.
O portão de entrada ostenta a data de 13 de maio de 1825, dividida por ambas as ombreiras. Apenas por coincidência essa é a data em que D. João VI legitimou a independência do Império do Brasil, pois não vemos motivo de interesse para perpetuar tal facto. Por outro lado, há historiadores que referem tratar-se provavelmente da data de construção deste portão, mas temos dúvidas porque não era hábito gravar-se a data em que se construía estruturas tão banais como esta. Quanto ao nome de Relvão, advém-lhe certamente por ser um espaço que não permitia a mobilização agrícola, por estar sobre o tufo consolidado do vulcão do Monte Brasil visível nalguns afloramentos, permitindo o crescimento de apenas alguns tipos de erva mais rústica. Ainda hoje uma das gramíneas mais presente é o Sporobolus-indicus, uma espécie capaz de se instalar e sobreviver em substratos mais áridos e secos. Por se ter perpetuado no tempo como um grande espaço relvado terá ficado eternizado na linguagem do povo como o Relvão.
Até ao início do século XIX não encontramos informações sobre este lugar, mas com a chegada de D. Pedro IV e da imprensa escrita à ilha Terceira o Campo do Relvão começaria a ser referido com frequência. Utilizado para a realização de exercícios e paradas militares dos efetivos aquartelados no Castelo, o Relvão viu intensificado o seu uso no contexto da Guerra Civil Portuguesa. Aqui se fizeram manobras e exercícios de preparação militar desde 1829, aqui passou revista o príncipe D. Pedro IV no dia 4 de abril de 1832 às tropas do denominado Exército Libertador e aqui se rezou missa campal antes da partida, tendo por destino final o desembarque destes bravos no Mindelo.
Nessa primeira metade do século XIX o Relvão tornou-se ainda campo de refúgio e de pernoita para grande número de famílias, quando a 5 de novembro de 1848, perto da 1 hora da madrugada, se fez sentir na cidade de Angra um violento tremor de terra, acompanhado de várias réplicas nos dias seguintes. Houve ainda quem tivesse avançado com a ideia de se fazerem aqui touradas, mas não há registo de tal ter acontecido. Entretanto o conselho administrativo do Castelo de São João Batista ia procedendo ao arrendamento do Campo do Relvão a quem tinha por interesse pastorear gado, como vem em jornal de 1894, continuando o mesmo a ser utilizado como carreira de tiro para os recrutas, algo que iria perdurar até à primeira metade do século XX.
É também na segunda metade do século XIX que surgem as Exposições Pecuárias, a primeira das quais terá sido uma iniciativa da Junta Geral do distrito, tendo ocorrido de 6 a 8 de setembro de 1857 como feira de gados, de produtos agrícolas e de manufaturas (ofício do Governo Civil de 13 do agosto). Há registo de outras, de 20 a 22 de junho de 1861 e em agosto de 1862. Nas primeiras décadas do século XX, essas exposições, entretanto transformadas em Concurso Agrícola, Comercial e Industrial seriam documentadas com várias fotografias, que hoje impressionam quem as vê pela afluência de visitantes que mostram.
No século XX o espaço encontrou outra dinâmica. A partir de 1909 a prática do futebol, que tinha sido introduzida no final do séc. XIX na ilha Terceira, ganha uma nova dinâmica. Numa iniciativa de Tomé de Castro (pai), Barradas de Noronha e Gabriel Varejão, improvisou-se no Relvão o primeiro campo da nossa cidade onde se realizaram match de foot-ball. Com a ocupação dos militares durante a Grande Guerra o terreno do Relvão é referido como tendo ficado impraticável. Uma fotografia de 1915, de um jogo no Relvão, deixa a ideia de que terão voltado para aqui os treinos e jogos, abandonando-se em definitivo essa prática por volta do ano de 1924, altura em que é inaugurado oficialmente o Campo de Jogos da cidade.
Sendo um dos espaços mais amplos de que Angra dispunha para grandes ajuntamentos de pessoas, o Relvão tornou-se palco de grandes eventos, nomeadamente de cariz religioso. Foi o que aconteceu em 1948 quando a imagem peregrina de Nossa Senhora de Fátima estava a percorrer as Ilhas dos Açores, com a realização no dia 13 de junho de uma missa campal onde se reuniu uma grande multidão de fiéis. Dois anos depois, no dia 6 de agosto de 1950, realizou-se a Festa dos Santos Padroeiros integrada nas comemorações do V Centenário do Povoamento da Ilha Terceira, outra grande manifestação religiosa do século XX que ocorreu nesta ilha cidade, com o cortejo a seguir por várias ruas de Angra, terminando no Relvão onde foi celebrada novamente uma missa campal.
A 20 de julho de 1963 o Ministério do Exército fez a cessão do Campo do Relvão à Câmara Municipal de Angra do Heroísmo por troca com serviços prestados pela autarquia numa urbanização que se encontrava a decorrer, do interesse do Exército. A gestão municipal não beneficiou grandemente o espaço nos primeiros anos mas, inevitavelmente, face ao potencial do espaço e a pressões da sociedade angrense as beneficiações foram surgindo e o Campo do Relvão acabaria por se tornar no Parque do Relvão. Hoje é um dos mais procurados espaços de recreio da cidade, bastante amplo e desafogado com os seus cerca de 32500 m2, facilmente acessível a quem venha a pé pelo centro da urbe ou pelo litoral.
Alberga um conjunto vasto de equipamentos recreativos e desportivos, o que permite alguma diversidade de atividades. À exceção dos passeios, que servem para caminhadas, o espaço encontra-se todo relvado, o que se torna ideal para as corridas e brincadeiras dos mais novos. Os equipamentos do parque estão agrupados por idades dos utilizadores, começando nos infantis e acabando nos equipamentos para adolescentes com maior desenvoltura e destreza. Em 1997 foi feito o primeiro grande investimento em equipamentos, fazendo surgir finalmente neste espaço um parque infantil adequado e diversificado, capaz de dar resposta à crescente procura de crianças e pais. O espaço foi sendo melhorado e reforçado com novos equipamentos ao longo do tempo, em particular com a construção em 2002 de um circuito de manutenção que obrigou a abrir novos caminhos de ligação. Foi a oportunidade também de se construir, na parte distal, um campo de minibasquete, um de minivoleibol e montar duas mesas de pingue-pongue. Em 2007 há novo reforço do equipamento recreativo a que se juntou em 2009 a instalação de um campo de jogos Panna. Em julho de 2010 faz-se a pavimentação com asfalto colorido a vermelho dos quase 1000 metros de caminhos internos do Relvão, que servem também de circuito de manutenção física, tornando o espaço mais atrativo e funcional. Em 2016 houve novas intervenções com a instalação de equipamentos de outdoor fitness e mais recentemente, em 2022, melhorou-se substancialmente a oferta recreativa em termos de equipamentos de recreação para as crianças. Para quem quiser levar uma recordação da sua passagem por este local pode sempre enquadrar-se numa moldura que está aqui colocada e tirar umas fotografias virado para a bonita baía de Angra e litoral sudoeste da ilha.
Conseguimos encontrar, em pequena quantidade, indivíduos arbóreos de algumas espécies como Plátanos, Amoreiras, Pinheiros-mansos, Salgueiros, Metrosíderos, Robínias e Catalpas. Acrescem algumas arbustivas como as Azáleas, Cevadilhas, Camélias e Ligustros, estas últimas duas formando sebes, merecendo também destaque as Beladonas, que nas partes mais altas dão uma cor espetacular a este espaço ao florirem. Refira-se também que logo à entrada, à espera do visitante, podemos ver a excelente obra de arte de Julian Voss-Andreae inaugurada em 2022, com o título “Aos presos políticos, desterrados e deportados”.
Há alguns anos foi feita uma baixada trifásica permitindo que o relvão passasse a ter disponível energia elétrica durante o dia, uma vez que apenas estava servida de iluminação pública noturna. Esse facto foi muito importante para a organização de eventos, tornando desnecessário os barulhentos geradores, como no caso da montagem de insufláveis para festas com crianças. Entretanto foram inúmeros e diversificados os eventos ocorrido neste espaço, tão díspares como: a realização de uma Via Sacra; campanhas públicas de sensibilização; corrida solidárias; comemorações do Dia do Pai ou do Dia da Mãe; provas de orientação; comemoração do Dia da Freguesia da Sé, em diversos anos; comemoração de aniversários e realização regular de atividades por parte de diversas instituições que trabalham com crianças; festivais de atividade física; provas de corta-mato e muitos outros convívios organizados por diversas entidades.
Em termos de mobiliário urbano encontramos vários bancos em pedra serrada ao longo do caminho principal e noutros locais, mais adequados ao descanso e contemplação, bancos ripados com costas que possibilitam mais algum conforto. Vários bebedores permitem saciar a sede no momento ou encher uma garrafa para levar. O caminho principal passa por duas robustas treliças, que aguardam por trepadeiras que consigam sobreviver à forte ressalga que assola este espaço, até chegar a uma estrutura com contornos de quiosque, único espaço onde é possível alguém se proteger de uma eventual chuvada que possa cair. Encontra-se servido de instalações sanitárias públicas desde 2023, instaladas no espaçoso parque de estacionamento que lhe está junto. Antes eram utilizadas outras instalações situadas em edifícios camarários nas proximidades, como a Casa da Palhoça, Campo de Ténis, antigo edifício da Liga dos Combatentes, ou mesmo as Instalações Sanitárias que estão nas escadas de acesso ao Portinho Novo. O acesso ao Parque do Relvão não está condicionado por horário de utilização. É, no entanto, proibida a entrada de animais neste espaço recreativo.
Hoje o Parque do Relvão está na passagem de quem faz o percurso pedestre PRC04TER do Monte Brasil ou o Passeio Panorâmico das Baías de Angra inaugurado em 18 de junho de 2018.
Paulo Barcelos – CMAH