É um percurso circular de 6,8 km de extensão, feito na freguesia da Serreta, no flanco oeste da Serra de Santa Bárbara. Este maciço geológico, de origem traquítica, que acrescentou o terço ocidental terrestre à ilha, formou extensas escoadas e grandes depósitos de pedra-pomes que projetados na atmosfera cobriram as lavas, por vezes formando estratos de muitos metros de altura, como os que se observam nos taludes da Ribeira do Além, por onde irá passar na fase final deste percurso. Por vezes a saída rápida das lavas dos focos eruptivos, com as condições da atmosfera no momento, forçam o arrefecimento muito rápido da lava, vitrificando-a, dando origem à obsidiana (= vidro vulcânico), pedra negra de arestas aguçadas, visíveis em diversos pontos deste percurso, dispersas pelo chão ou misturadas na pedra-pomes dos taludes. A obsidiana, usada pelo povo Maia para fazer facas para sacrifícios, é hoje utilizada como lâmina de corte em cirurgias, em artesanato e ourivesaria (é uma pedra semipreciosa), nomeadamente na joalharia regional, e em artefactos terapêuticos e esotéricos. Ficou imortalizada na Guerra dos Tronos como o “Vidro de Dragão”, único material capaz de destruir os mortos-vivos White Walkers. Pode ainda levar de recordação uma pedra-pomes, uma rocha que flutua na água. Esta é uma zona de pastagens de altitude, que surgiram em consequência de arroteias realizadas há cerca de 5 décadas, algumas com recurso a máquinas. Nas divisões das parcelas observam-se louros (Laurus azorica), urzes (Erica azorica) e o cedro-do-mato (Juniperus brevifolia), a par das criptomérias sempre presentes.
A primeira parte do percurso é feita a subir, até atingir a Lagoinha. Comece por subir por um antigo caminho, em que o chão é um misto de terra e pedras. Olhando o mar atrás de si avista com nitidez a ilha de São Jorge, com a montanha da ilha do Pico por detrás. Em breve estará numa vereda no meio de matas de acácias, eucaliptos, cedros-do-mato e criptomérias, onde deixará de ver o sol, bloqueado por uma galeria de incensos (Pittosporum undulatum). No chão terroso e húmido crescem cerca de dez diferentes espécies de fetos e alguns estranhos cogumelos, entre os afloramentos rochosos forrados de musgos. Esta é uma vereda de chão bastante irregular, baixo em relação aos terrenos laterais, talhada pela circulação humana e animal e pelos fatores erosivos. Enquanto avançamos a subida torna-se mais íngreme e a vegetação com uma maior cobertura de espécies naturais.
Ouvimos por entre a vegetação a curiosa estrelinha, o melro-preto e pombos. O trilho fica mais suave e à sua esquerda uma linha de água cavou um pequeno vale repleto de grandes fetos, onde predomina o feto-do-botão (Woodwardia radicans). O chão, de bermas amareladas pelo musgão (Sphagnum sp.), cruza um pequeno afluente de uma ribeira, que raramente tem água, e entramos numa mata de imponentes criptomérias. Pelo caminho encontramos um pouco inesperadamente alguns pés de Angelica lignescens e de Sanicula azorica, espécies endémicas dos Açores, raras e preciosas.
Voltamos a subir, com as raízes a aflorar no chão do trilho, que adiante dão lugar às folhas das acácias que se espalham por todo o lado. Surge a uva-da-serra (Vaccinium cylindraceum), os tamujos (Myrsine africana) e o folhado (Viburnum treleasei) com cachos de bagas acetinadas. Passamos junto de uma pequena mata de cedro-fino (Chamaecyparis lawsoniana) com o cheiro inconfundível que se liberta das folhas escamiformes dispostas em pequenos raminhos espalmados.
Uma subida de alguns minutos, com degraus formados por pequenos troncos, conduz-nos por um terreno de relevos acentuados pela erosão hídrica. Surgem as hortênsias que crescem por todo o lado. Chegamos a um caminho de terra, por onde só transitam veículos todo-o-terreno. Siga para a direita. Os lados deste caminho compõem-se de azevinhos (Ilex perado ssp. azorica), urzes, louros, folhados, cedros-do-mato, Tolpis azorica, Potentilla erecta, Lysimachia azorica, heras, musgão, Woodwardia radicans, Osmunda regalis, Lycopodiella e muitas outras espécies, formando perfeitas comunidades de montanha.
Uns bons metros depois encontra uma placa que sinaliza a subida ao cimo do Pico da Lagoinha, que nasceu no flanco da Serra de Santa Bárbara, por um atalho bastante erodido pela água que nele corre de Inverno e onde se sente a falta de mais degraus. Alguns troncos colocados ao longo da subida e degraus talhados no chão tentam resolver o problema do piso escorregadio e dos desníveis que há para vencer nesta subida. Faz-se, no entanto, em cerca de 10 minutos.
Já no cimo o atalho segue em direção ao marco geodésico, não sem antes encontrar pelo caminho um miradouro sobre a lagoa. No marco, olhando o mar, vê o derrame de lava que separa as povoações da Serreta (à esquerda) e do Raminho (à direita). Alinhando o olhar por 2 vértices deste marco, colocado aqui em 1951, deverá conseguir avistar sem problemas a ilha Graciosa.
Junto ao miradouro da Lagoinha da Serreta avista esta cratera de contornos quase perfeitos, com as suas águas límpidas. É pequena mas bonita pela envolvência geológica e posicionamento na encosta da serra. Mantém uma integridade enquanto ecossistema lagunar que a torna de grande importância para a vida selvagem, nomeadamente aves migratórias que por aqui passam. Está dentro da Área Protegida para a Gestão de Habitats ou Espécies do Planalto Central e Costa Noroeste.
De regresso ao caminho vermelho, devido ao piso em bagacina, irá encontrar algumas linhas de água (afluentes da Ribeira da Lapa) e, mais adiante, um sinal a indicar que deve entrar na pastagem à sua direita, seguindo as marcas deixadas pelas rodas das viaturas para, 100 m depois, subir para o talude que faz a fronteira entre a pastagem e a vegetação natural. Durante os próximos passos vai acompanhar um dos braços da ravinosa Ribeira de Além. Aqui e ali, onde os espigos-de-cedro (Arceuthobium azoricum) crescem sobre o cedro-do-mato, abrem-se pequenas janelas na vegetação que permitem observar o profundo vale, desgastado pelo tempo e pela água até encontrar o manto rochoso que abrandou este processo. Esta é uma paisagem impressionante. O atalho junto à ribanceira acaba, enquanto se aproxima do Pico Negrão, onde o caminho que nos espera se transforma numa instável e alucinante descida, com o chão a resvalar frequentemente sob os pés. Felizmente, de quando em vez, aparecem alguns degraus que dão uma providencial ajuda. A meio dessa ladeira surge um miradouro que permite ver melhor, olhando para cima, o vale da Ribeira de Além. No fim desta descida um caminho leva o pedestrianista de volta à viatura.
Paulo Barcelos – CMAH