O espaço que hoje é o jardim do Palácio dos Capitães Generais terá sido delimitado no final do século XVI aquando da construção do Colégio dos Jesuítas. Os padres da Companhia de Jesus mudaram-se no início do século XVII tomando para si este espaço, a norte da ala que lhes servia de residência, transformando-o em “cerca”, cultivando-o e retirando daqui alguns dos produtos que consumiram durante século e meio. Em meados do século XVIII, com a expulsão dos Jesuítas de Portugal, este espaço foi perdendo essa utilidade. Com o decorrer dos anos foi-se convertendo em jardim, mantendo algumas árvores de fruto, mas até essas acabariam por desaparecer. Hoje vêem-se ainda remanescências que recuam a esse período, nomeadamente no curioso muro que percorre longitudinalmente a fachada tardoz do palácio e que segue subindo a Rua do Marquês, que apresenta as típicas banquetas para descanso e que se encontra encimado por um canteiro de suculentas entalhado na própria cantaria de cobertura.
Com o tempo, os passeios ficaram mais largos, introduziu-se maior variedade de flores e de árvores de sombra, acabando as várias entidades que viriam a ocupar o Palácio por promover o aproveitamento social do jardim. No século XIX por diversas vezes tocou aqui a banda militar e, como era próprio da época, foi palco para fotografias de quem participava nos eventos que aconteciam no palácio.
Condicionado pelo desnível natural do terreno primitivo, houve necessidade de compensar a diferença de cota entre o palácio e o terreno do jardim. A solução foi fazer-se o acesso a partir do 1º andar das traseiras do edifício por duas pontes que levam a um balcão alargado e daí por duas pequenas escadas que sobem ao plateau onde fica o jardim, que a partir daqui se desenvolve de forma simples e suave numa plataforma única. No extremo norte, num plateau superior, junto a um portão de acesso de viaturas, existe um edifício de garagem e oficinas e uma estufa fria que ainda conserva partes das colunas em pedra que antes a sustentava. Tem ainda hoje a mesma funcionalidade podendo apreciar-se diferentes plantas ornamentais envasadas.
Numa visita que o arquiteto paisagista Gonçalo Ribeiro Telles fez a Angra, pouco tempo depois do Sismo de 80, deslocando-se à Direção Regional dos Assuntos Culturais que à época funcionava no Palácio dos Capitães Generais, foi-lhe pedido pelo então Diretor uma sugestão para o jardim, que se pretendia intervencionar. Logo ali Gonçalo Ribeiro Telles esquematizou a solução que acabaria por dar a forma que o jardim hoje possui.
Entrando no jardim pela ponte principal encontramos 4 tapetes relvados, cortados por largos passeios em bagacina vermelha. Seguindo pelo principal, deparamo-nos primeiro com uma parte mais alargada, que permite montar alguma estrutura temporária de maiores dimensões que se pretenda. Depois de passar pelos únicos dois bancos em madeira do jardim, chegamos a um chafariz monumental delimitado por colunelos salomónicos, que ostenta a meio uma bacia de receção de águas e por baixo 2 pequenos tanques encastrados, lado a lado, ladeado por dois frondosos plátanos. Este chafariz veio transferido em 1983 de uma casa particular na Rua Direita, doado pela família Reis Simões. Recuando no século XX, quem visitava o jardim podia apreciar neste mesmo local outro imponente chafariz, cuja água corria abundantemente sobre um tanque de dimensões consideráveis, e que apresentava uma volumosa pia em pedra, ao jeito de vaso. Após o Sismo de 80 a pia acabou por ser colocada como decoração num dos corredores da ala sul do Palácio. Numa parte mais reservada do jardim foram guardadas várias seções de calhas talhadas na pedra que parecem ter servido para nelas correr água, embora não me tenha sido possível assegurar se estariam montadas no jardim ou noutra parte do palácio. Em termos decorativos encontramos ainda nos muros as banquetas de pedra, que aqui seriam mais conversadeiras que propriamente namoradeiras, e possui (alguma) iluminação pedonal e cénica.
Seguindo para a esquerda, num dos canteiros junto ao passeio, podemos encontrar uma escultura contemporânea da autoria de Ricardo Lalanda que já não se encontra como o autor a instalou. A partir de um conjunto de lajetas em pedra o autor terá erguido simbolicamente uma janela, ao que julgo saber, que mais tarde se desmoronou, não tendo sido ainda possível recuperá-la.
Em termos botânicos o jardim apresenta alguma diversidade, condicionada obviamente pela área disponível que apresenta, de cerca de 3400 m2. Apresenta flora exclusivamente exótica, sem grandes raridades. Salientam-se pelo porte os exemplares arbóreos, nomeadamente uma araucária (Araucaria heterophylla), dois plátanos (Platanus hybrida), palmeiras-das-canárias (Phoenix canariensis), palmeiras-das-vassouras (Chamaerops humilis), um metrosidero (Metrosiderus excelsa), uma coralina (Erythrina speciosa), uma sumaúma (Chorisia speciosa) e no topo norte outra que penso ser uma canforeira (Cinnamomum camphora). De menor porte temos vários dragoeiros (Dracaena draco), camélias (Camelia japonica), uns curiosos araçazeiros (Psidium cattleyanum) de tronco bastante grosso, manacás (Brunfelsia latifolia), rododendros (Rhododendron sp.), fetos arbóreos (Cyathea cooperi), palmeiras-areca (Dypsis lutescens), barrilheiras (Corynocarpus laevigatus), magnólias (Magnolia sp.), lagerstroemias (Lagerstroemia indica), hibiscos, cicas, tetrapanax, aloés, rhaphiolepis, buxus, estrelícias (Strelitzia reginae e Strelitzia nicolai), várias bromélias, lílios, agapantos e muitas outras herbáceas ornamentais. O caracter vivaz das espécies utilizadas torna este jardim agradável e de fácil manutenção, onde não falta um conjunto significativo de suculentas.
Propriedade da região, está confinado entre a Rua do Marquês e Rua do Palácio, sendo parte integrante do Palácio dos Capitães Generais que hoje serve de sede da Vice Presidência do Governo dos Açores. De terça a domingo, entre as 10:00 e as 17:00, pode adquirir por 2 ou 3 euros um bilhete (dependendo da dimensão do grupo em que está inserido) para uma visita guiada de cerca de meia hora a uma parte do palácio, ficando no final livre para visitar uma exposição permanente e este jardim, de que vos falo.
Paulo Barcelos – CMAH